sexta-feira, 4 de abril de 2008

FAÇA UMA GENTILEZA PELOS ANIMAIS


O PÁSSARO CATIVO

- OLAVO BILAC -

" "Por que me prendes? Solta-me covarde! Deus me deu por gaiola a imensidade: Não me roubes a minha liberdade ... Quero voar! voar! ... "

Estas coisas o pássaro diria, se pudesse falar. E a tua alma, criança, tremeria, vendo tamanha aflição: e a tua mão tremendo, lhe abriria a porta da prisão... "

SEJA A VOZ DOS ANIMAIS SILVESTRES AMEAÇADOS DE SER ENGAIOLADOS E TRANSFORMADOS EM MERCADORIAS.

O IBAMA DISPONIBILIZOU PARA CONSULTA PÚBLICA UMA LISTA DE MAIS DE 50 ESPÉCIES DA FAUNA SILVESTRE, QUE PODERÃO SER CRIADAS E COMERCIALIZADAS COMO ANIMAIS DE ESTIMAÇÃO.

EM NOME DOS SERES QUE TÊM O DESEJO DE VIVER EM LIBERDADE, EXPRESSE O SEU REPÚDIO PELO COMÉRCIO DE ANIMAIS, ENVIANDO UM E-MAIL PARA
FAUNA.SEDE@IBAMA.GOV.BR ATÉ 06 DE ABRIL.

SEJA GENTIL COM A VIDA
MANIFESTE-SE PELA LIBERDADE

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A FAUNA SILVESTRE COMO MERCADORIA: MAIS UMA VITÓRIA DO ESPECISMO?



Autora: Paula Brügger - brugger@ccb.ufsc.br Fonte: www.sentiens.net




O Ibama - Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - disponibilizou para Consulta Pública uma lista com mais de 50 espécies da fauna silvestre nativa que poderão ser criadas e comercializadas como animais de estimação*. Répteis como iguanas e o lagarto-preguiça e uma grande variedade de aves como o tucano, o tico-tico, a graúna, e diversos tipos de psitacídios - como periquitos, araras, caturritas e papagaios - poderão compor o novo rol de animais que serão criados e vendidos como "pets".

Na contramão de uma ética biocêntrica:

O primeiro preceito de ordem ética que tal consulta afronta é o fato de os animais não-humanos serem seres vivos sencientes e não coisas. Portanto, jamais poderiam ser "objetos" passíveis de mercantilização. Já não basta termos interferido ao longo de nossa trajetória histórica no planeta – por meio da domesticação - no curso de tantas outras espécies? Mesmo desconsiderando nesta discussão todo o sofrimento imposto aos bilhões de animais criados com a finalidade de serem abatidos para consumo humano (e os conseqüentes impactos ambientais e sociais decorrentes dessa prática), os problemas advindos da domesticação de animais como cães e gatos, sobretudo nos ambientes urbanos, ainda estão longe de ter uma solução. Por que, então, persistir, ampliar e legitimar uma relação com o entorno que tem sido tão problemática? A resposta para essa pergunta jaz, em grande parte, na visão antropocêntrica de mundo que guia nossa cultura. Vemos a natureza como uma grande fábrica, ou seja, como um conjunto de recursos ou meios para se atingir um fim: o de servir aos interesses humanos. E esse ideário está presente inclusive no nome do órgão responsável pela estapafúrdia consulta.

Na contramão da prudência ecológica:

O Ibama argumenta que como o Brasil é signatário da "Convenção sobre Diversidade Biológica", cujo objetivo é - em tese – a conservação da diversidade biológica e a utilização sustentável de seus componentes, tal medida seria importante para prevenir e combater na origem as causas da redução ou perda da diversidade biológica e controlar ou erradicar e impedir que se introduzam espécies exóticas que ameacem os ecossistemas, habitats ou espécies, entre outras questões. Mas é no mínimo contraditório que um país signatário de tal "Convenção" tenha uma política agrícola baseada na produção de commodities - como grãos e carne – cuja produção é responsável pela devastação de uma das florestas mais ricas em biodiversidade do planeta: a Amazônica. E a própria resolução 394 do CONAMA (que trata da mencionada consulta) reconhece que, para a aprovação da lista, diversas questões deverão ser levadas em conta. Entre elas estão: o potencial de invasão dos ecossistemas fora da área de distribuição geográfica original de tais espécies (incluindo outros países); o potencial de riscos à saúde humana, animal, ou ao equilíbrio das populações naturais; a possibilidade de introdução de agentes biológicos com potencial de causar prejuízos de qualquer natureza; o risco de os espécimes serem abandonados ou de fuga, etc.

A quem interessa tal lista? Como ficam os interesses dos animais?

Uma vez que há também muitas vozes que se levantam contra tal proposta, é fácil perceber que a criação e comercialização de animais silvestres visam tão somente a atender a satisfação dos desejos hedonistas de alguns seres humanos e criadores que lucrarão às custas do sofrimento dos animais. Tal medida, além de não respeitar o atributo de senciência e de desconsiderar os animais não-humanos como sujeitos de suas vidas (veja os filósofos Peter Singer e Tom Regan), poderá causar danos à biosfera mesmo sob um ponto de vista meramente instrumental, pois não se encontra em consonância com uma visão sistêmica de sustentabilidade e tampouco com um "uso sustentável da biodiversidade", como desejam seus proponentes. Além de excluir a dimensão ética da sustentabilidade (evoca-se apenas a dimensão cultural na forma dos "anseios da sociedade brasileira" – sic-, uma questão de ordem estética, não ética), a medida poderá gerar um sem-número de externalidades que serão pagas por toda a sociedade e inclusive pelas gerações futuras, como os riscos apontados antes e questões mais imediatas como: animais abandonados, atropelados ou estropiados (necessitando de cuidados); a necessidade de intervenções cirúrgicas como castrações etc; os absurdos gastos com fiscalização para saber quais animais são nascidos em criadouro comercial legalmente estabelecido (uma meta cujo sucesso me parece extremamente difícil, além de não justificar sob o ponto de vista ético a comercialização dos animais), etc. Em vez de facilitar e legitimar a produção de tais riscos, o Poder Público deveria investir em projetos de educação e em medidas que visem a proibir a criação e a venda de animais de estimação. E isso seria apenas um começo, pois, a rigor, nenhum animal deveria ser criado e comercializado, para nenhuma finalidade.

Um triste cenário?


Caso a consulta pública em questão venha a dar respaldo a tal ato de insensatez poderá haver, em breve, um novo cenário no país no qual o encarceramento de répteis e aves se tornará uma prática corriqueira e legal (sic). Privados de seu bem mais precioso, sua liberdade – e aprisionados em jaulas, fossos, viveiros e gaiolas - espécimes da fauna silvestre serão apenas a sombra do que foram um dia na natureza, independentemente de terem sido criados para isso ou não. Serão mais uma mercadoria nas vitrines de pet shops e outros pontos de venda, produtos prontos para "divertir" os seres humanos. Termino com um trecho da belíssima música "Passaredo" de Chico Buarque e Francis Hime:

"Some rolinha; Anda, andorinha; Te esconde, bem-te-vi; Voa, bicudo; Voa, sanhaço; Vai, juriti; Bico calado; Muito cuidado; Que o homem vem aí; O homem vem aí"

(*): Conforme determina o Art. 3º da Resolução Conama nº 394 de 6 de novembro de 2007. A Consulta Pública estará disponível até o dia 6 de abril de 2008 no site do Ibama.
Paula Brügger é bióloga, professora do Depto. de Ecologia e Zoologia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), ex-membro da Comissão de Ética no Uso de Animais - (CEUA), mestra em Educação e Doutora em Ciências Humanas - Sociedade e Meio Ambiente. É autora dos livros "Educação ou adestramento ambiental?", que está na 3ª edição, e "Amigo Animal – reflexões interdisciplinares sobre educação e meio ambiente". Atualmente coordena o projeto educacional "Amigo Animal". E-mail:
brugger@ccb.ufsc.br.